segunda-feira, 15 de março de 2010

SR. ANTONIO ROQUE


Foto by Fernando Campanella

"...Eu sou velho o suficiente agora para fazer amigos..." (Ezra Pound)


Hoje viajo àquela pequena cidade em busca do Sr. Antonio. Conforme relatado na postagem anterior, vou entregar-lhe a foto que dele tirei, como um presente.

Descubro o endereço de sua sobrinha, vou até sua residência e me apresento. E fico sabendo do falecimento do tio, ocorrido há alguns meses.

Cheguei um pouco tarde, meu amigo já havia partido. Mas entrego o presente à mulher. E sou por ela informado que ele nunca deixava que o fotografassem. Eu me lembro que resistira, a princípio, quando o abordei naquela tarde, pedindo-lhe um retrato. Tive um privilégio enorme, então, ao conseguir meu intento.

A senhora , emocionada, pergunta-me sobre o preço de meu trabalho. Peço a ela somente que coloque a foto em uma bela e resistente moldura. A imagem deste 'rei de outros tronos', será assim eternizada.


Indaguei-lhe sobre alguns detalhes da vida do tio. Antonio Roque, esse o seu nome completo. Trabalhara a vida toda na roça, nunca se casara, sempre fora uma pessoa calma, de bem com a vida. Com o benefício de um salário do INSS vivia com a sobrinha, seu marido e filhos.

Fico sabendo também, com alegria, que dissera à família à época que alguém havia tirado sua foto na rua.

Faleceu aos 79 anos de idade, de pneumonia. No hospital de uma cidade maior, onde fora internado, os enfermeiros disseram à sobrinha, após sua morte, que no período lá recluso, seus dias finais, permanecera sempre calmo, de nada reclamando, 'indo para o abatedouro que nem um cordeiro'.

Nem preciso mencionar minha tristeza por ter me atrasado em procurá-lo, não podendo entregar-lhe a foto em mãos e dizer-lhe como ficara bem nela.

Esta estória poderia ter tido um outro final. Eu visualisara o sorriso de contentamento do Sr. Antonio, seu agradecimento, um belo reencontro entre nós nestes vai-e-vens da vida. Não era para ser assim, porém.

Meu amigo agora navega um rio mais profundo, anterior ao de sua aldeia, ao Congo, ao Nilo...




(Fotos têm estórias por trás. Talvez aí resida grande parcela do encanto, do fascínio da fotografia.)

Fernando Campanella



Música escolhida para esta postagem:

7 comentários:

  1. Que história, Fernando! O Sr. Antonio, certamente antecipando sua partida, quis deixar uma lembrança a sua família através da sua arte...

    Bjs.

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  2. Isso é demais!! Sem palavras! Sem maiores comentários... O q fica é a imagem ali em cima... e acima de tudo a mensagem, de que na vida td é lindo, ms td passa... Belíssima postagem!!!

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. ps: ele ficou eternizado aqui, na sua fotografia.
    o encontro (e o desencontro) dele com o fotógrafo dá uma belíssima crônica.

    o sr antonio roque, em PB ou em cores, é pura poesia.

    abraço grande, fernando!

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  5. Fernando, meu caro Poeta, vemos que a vida real nos reserva grandes histórias.

    Amigo poeta venho convidá-lo a buscar sêlo comemorativo de 1 ano do blog 'Nossa poesia de cada dia', pois seus versos fazem parte desta festa com imagem do amigo Antônio Carlos.

    Sds.

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  6. Campanella,
    Que história fantástica, rapaz. Quanta beleza nessa história triste, se é que ela é triste; troquemos por comovente, o adjetivo. E a vida vale mesmo é por esses rios que correm em nossas veias expostas ao tempo. Ao tio Antônio Roque: que a terra lhe seja leve! O tempo, foi-lhe.
    E a fotografia faz jus ao enredo, que, como o Roberto notou, dá belíssima crônica mesmo, amigo.
    Aliás, eu vivi uma história parecida com essa, que pus numa canção, sobre um casal de cantores (Marcos e Bianca) que conheci em Vitória/ES, dupla que se desfez com a morte prematura e repentina da companheira naquele par musical.
    Noutra oportunidade, conto (canto) o resto...

    Abraço mineiro,
    Pedro Ramúcio.

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  7. História de vida maravilhosa! Também o teu gesto foi belo.
    Sempre me dói a ideia de que temos que partir, mesmo se velhos.
    bjs

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