quinta-feira, 12 de março de 2009

FRUTOS DA TERRA


Frutos da terra, tela de Frida Kahlo
http://ciberpalheiro.blogspot.com

Benditos os filhos do ventre da terra
Que o sol desperta tão cedo,
O trigo e a uva os aguardando no campo
Para o mágico processo do pão e do vinho.

Benditos os frutos da terra
Que se abrem à manhã
Em silêncios e cantos
Que mesclam no ar

E os filhos da paz,
Que ligam o céu ao mundo,
Os que reciclam o dia
E dele retiram sustento e eternidade.

Abençoados os que bendizem,
Os que curam, e que a dor amenizam,
Os que por via de tolerância
Se entendem.

Benditos os que domam a cólera
E se transformam no amor,
Amor que bebe da identidade da vida.



Bendito o sol que amadurece os frutos de terra.
Mais bendita a luz
Por que anseia ‘a noite escura da alma’*.

Fernando Campanella, 1985




* Noite escura da alma, metáfora inspirada
nos versos de São João da Cruz,
em seu poema 'Noite Escura, abaixo:



Em uma noite escura
De amor em vivas ânsias inflamada
Oh! Ditosa ventura!
Saí sem ser notada,
´stando já minha casa sossegada.
Na escuridão, segura,

Pela secreta escada, disfarçada,
Oh! Ditosa ventura!
Na escuridão, velada,´
stando já minha casa sossegada.
Em noite tão ditosa,

E num segredo em que ninguém me via,
Nem eu olhava coisa alguma,
Sem outra luz nem guia
Além da que no coração me ardia.
Essa luz me guiava,

Com mais clareza que a do meio-dia
Aonde me esperava
Quem eu bem conhecia,
Em lugar onde ninguém aparecia.
Oh! noite, que me guiaste,

Oh! noite, amável mais do que a alvorada
Oh! noite, que juntasteAmado com amada,
Amada no amado transformada!
Em meu peito florido

Que, inteiro, para ele só guardava,
Quedou-se adormecido,
E eu, terna o regalava,
E dos cedros o leque o refrescava.
Da ameia a brisa amena,

Quando eu os seus cabelos afagava,
Com sua mão serenaEm meu colo soprava,
E meus sentidos todos transportava.
Esquecida, quedei-me,

O rosto reclinado sobre o Amado;
Tudo cessou. Deixei-me,Largando meu cuidado
Por entre as açucenas olvidado.