Foto by Fernando Campanella
EM SEDA
Por esta luz que me alumia
e me inventa em seda a estrada
entre a arte, alívio da memória,
e o mais trêmulo aceno do nada
- se com o mundo me acertei,me dasavim
já nem sei -
sou o que perdidamente
tomou rumo de mim.
Fernando Campanella, 2010
Há uma implacável dinâmica no tempo que nos faz eternos perdedores do presente, tecelões e ao mesmo tempo desfiadores da memória. E a memória se presta a isto: a desfilar seus fantasmas. Por isso ela é melhor rediviva na arte. A arte que, para mim, é a sìntese, a reconstrução possível, a recuperação sonhada, e eu diria , quase, a felicidade, mas esse conceito me escapa. Fico com a satisfação interna, com a possibilidade.
(Fernando Campanella)
A LUA DE LI PO
(BEBO SOZINHO AO LUAR)
Entre as flores há um jarro de vinho.
Sou o único a beber: não tenho aqui nenhum amigo.
Levanto a minha taça, oferecendo-a à Lua:
com ela e a minha sombra, ja somos três pessoas,
Mas a Lua não bebe, e a minha sombra imita o que faço.
A Sombra e a Lua, companheiras casuais,
divertem-se comigo, na primavera.
Quando canto, a Lua vacila.
Quando danço, a minha Sombra se agita em redor.
Antes de embriagados, todos se divertem juntos.
depois, cada um vai para a sua casa.
Mas eu fico ligado a esses companheiros insensíveis:
nossos encontros são na Via-Láctea.
(Li Po, tradução de Cecília Meireles)