quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

OS RIOS DE NOSSAS ALDEIAS


Rio Mandu, de Pouso Alegre, MG
Foto by Fernando Campanella


Quando mostrei a foto acima a um conhecido, ouvi algo como: 'Quem diria, não dá para reconhecer nosso velho, poluído, mal-cheiroso Mandu.'

O comentário me deixou feliz, por um lado, pois nele estava implícito um certo elogio à imagem do meu rio que eu registrara. Por outro, é triste constatar como nos distanciamos de coisas 'banais' como a natureza, dando as costas para suas manifestações que, para dizer o mínimo, nos viram nascer, e nos sobrevivem.

Às vezes, experimento, também, a estranha sensação de ser um Quixote, um romântico, anacrônico, vendo coisas que não existem, em fotos que crio, as quais parecem não corresponder à crua realidade dos fatos.

O rio em questão, por exemplo, já perdeu quase toda sua mata ciliar, é depósito de esgoto ( uma ' cloaca a céu aberto') e vem sofrendo acúmulo de entulhos e início de favelização às suas margens. Não faço vista grossa a essa realidade, jamais. E tudo isso, proveniente da inconsciência e do descaso, ainda mais me entristece. Mas insisto em buscar a beleza, anacrônico ou não, esteja ela onde estiver, ou onde meus olhos a virem, um projeto de alma.

Em um tempo de alarme ecológico, da babel de conferências do clima, e ainda com referência ao rio de minha, e de todas as aldeias, deixo aqui um pensamento, uma límpida frase, que muito me tocou nesta semana: 'A várzea pertence ao rio', da geógrafa, professora da USP, Odette Seabra.

As várzeas pertencem aos rios, os glaciares aos polos, as fragatas ao mar... Teremos que rever nosso insensato processo de urbanização, nossa relação com o ambiente, se buscamos a sobrevivência de nossa espécie. E artistas, afinal, à frente dos ecologistas, há muito vêm expressando isso na beleza 'ínútil' de sua arte.

Fernando Campanella