quarta-feira, 20 de maio de 2009

DA LUA


Foto by Fernando Campanella

LUNARES


Foto by Fernando Campanella

Ora enigma, e oráculo, ora reminiscências de Li Po; ora aridez, e tentáculo, ora floreado barroco, ou de uma 'art noveau', a lua em três tempos, seus motos e motivos em mim:


A lua é um criptograma.
Decifra-me - diz ela
à minha metade analítica
e trôpega.
À minha outra porção,
mais distraída
ante o mistério das coisas,
ela sussurrra apenas:
bebe de meu halo e sonha.

Fernando Campanella, 1992

Lua retrô
De Kioto
Da monja implume
De mel

De meu silêncio oco

Lua nouveau
Do esgoto
Do vaga-lume
Da sarna ardente

Do ovo choco.

(Fernando Campanella,09 de Março de 2009)

Lua, lua, lua,
três vezes giro
para retornar
à fria estática
de teu silêncio

(nada, nada, nada
senão eco
reflexo
de meu pensamento)

(Fernando Campanella, Maio de 2009)

CREPÚSCULO, ARTE E EMILY DICKINSON


Foto by Fernando Campanella

As tardes de outono propiciam crepúsculos inigualáveis. Embora os atores – nosso velho, vaidoso sol, as frívolas nuvens, o ar, o imponderável vento... – sejam sempre os mesmos em outros períodos do ano, é nesses dias que precedem o inverno que os espetáculos do fim da tarde rendem maior vibração em luz, forma, cor e tom.

Os crepúsculos outonais lembram algo como o capricho de um demiurgo a brincar com infinitas possibilidades na reorganização de toda matéria pré-existente. Uma arte de tamanha grandeza, de tão poderoso efeito ,onde o criador, o sujeito, se esquece e se confunde com o objeto da própria criação.

Assim, em escala menor, com todos artistas que, movidos por um impulso interno, reestruturam o que vivem, o que recebem, neste insondável processo mágico que denominamos ‘criar’.

Assim, com a poetisa Emily Dickinson que, tocada pelos fenômenos naturais de Amherst, reestruturou as impressões, as emoções internas, rendendo este maravilhoso crepúsculo-poema:

219


Ela varre com vassouras multicores
E sai espalhando fiapos,
Ó Dona arrumadeira do crepúsculo,
Volta atrás e espana os lagos:

Deixaste cair novelo de púrpura,
E acolá um fio de âmbar,
Agora, vejam, alastras todo o leste
Com estes trapos de esmeralda!

Inda a brandir vassouras coloridas,
Inda a esvoaçar aventais,
Até que as piaçabas viram estrelas —
E eu me vou, não olho mais.

Tradução: Aíla de Oliveira Gomes

219
She sweeps with many-colored Brooms —
And leaves the Shreds behind —
Oh Housewife in the Evening West —
Come back, and dust the Pond!

You dropped a Purple Ravelling in —
You dropped an Amber thread —
And how you've littered all the East
With duds of Emerald!

And still, she plies her spotted Brooms,
And still the Aprons fly,
Till Brooms fade softly into stars —
And then I come away —