Península Ibérica à noite, foto pela Wordpress |
Pelas imagens do satélite, via Internet, vejo a noite se aproximando da nossa porção ocidental da
terra, sinto seu movimento lento, quase implacável, eu diria. Mas em termos
mais precisos, nós, nossa aldeia, a casa onde vivemos, é que estamos
caminhando, inadiáveis, para ela. Logo
folgaremos, temporariamente, do sol, mergulhando, uma vez mais, na sombra imemorial do universo.
Visto assim, de fora, nosso planeta é
fundamentalmente belo. Ou melhor, a terra é, sob qualquer abordagem,
bela, porquanto uma criação de deuses,
uma vontade de um Deus, ou um feliz acaso brotado do caos cósmico.
Mas na perspectiva de um satélite, à distância, ela assume uma leveza,
quase uma fragilidade, no inimaginável alcance do cosmo. Imagino os grandes
gênios da astronomia - Copérnico, com a teoria heliocêntrica , Kepler e sua descoberta das órbitas elípticas dos planetas, Galileu, com a sua lendária
afirmação “Eppur si muove” - assistindo
a esse espetáculo disponibilizado a um cidadão comum pela Google Earth, um
programa de computador que apresenta modelos tridimensionais do globo
terrestre, visualizações da lua e de Marte e outros planetas, permitindo até nossa "navegação" pelo
universo.
O que mais me atrai a atenção nessas imagens, é o movimento da
sombra, como se eu estivesse assistindo a uma tempestade se aproximando. Mais
que isso, ainda, é ver ali estampado, quase palpável, o
nosso velho sono de cada dia. Na África
do Sul já é noite neste momento, e a
sombra se acerca do Atlântico oriental. Logo, dentro de 4 ou 5 horas, estará
batendo à minha casa, responsável e pontual. Eu a deixarei entrar e a
espantarei com luzes, como sempre.
Essa escuridão “ambulante” vista na tela de meu computador abre para
mim uma outra dimensão, dilui uma certa angústia do que não vejo, do que não se
revela. Contemplá-la por uma ótica afastada da terra possibilita-me uma outra
relação com opostos de luz e sombra que tantas vezes gritam dentro de nós. E, sobretudo, poder mudar as posições do
globo e ver que no Japão é a manhã que agora se aproxima traz-me um grande
alívio.
Nesta era da virtualidade, assediada por imagens, até a noite, vista e transmitida por aparelhos de satélites, adquire o status de celebridade, embora cumpra apenas
seu diário, intransferível ofício de nos trazer nosso outro lado, o inconsciente, de nos lembrar a gênesis envolta em mistério, o barro
etéreo, ainda indecifrável, de que fomos
criados.
Fernando Campanella
Youtube THE SOUND OF COSMOS, Alpha, enviado por TheSoundOfCosmos