sexta-feira, 18 de setembro de 2009

VISLUMBRE


Foto by Fernando Campanella


Se existe uma metáfora ou mesmo uma técnica
para a gradual apreensão de Deus
seja a de meu lento aproximar de pássaros
quando para uma manhã de fotografias eu saio.

Sabiá pousado, primeiro disparo, depois três passos,
segunda tomada, mais três, e, em série registrando,
me achego até onde a ave o permita,
demarcado entre nós o intransponível espaço.

Após o vôo alçado, vou conferir as mais límpidas faces
da maravilha outorgada, em fotos.
Tal meu artifício para explorar esses reinos
de que os humanos foram há ‘eons’ alijados.

Talvez um dia, na inesgotável alquimia dos tempos,
o pássaro, como Deus, de mim não mais escape
e eu revele sua melhor, definitiva face.

Ou, quem sabe, rasgue a ave o círculo,
e para os domínios do eterno me conduza
nas fímbrias de suas transparecidas asas.

Talvez... mas não haja pressa. Dêem-me os céus
a infinita paciência daquele eremita dos montes:

em minha caverna mais funda,
no burburinho de minhas fontes,
a incomensurável graça
de captar tais vislumbres alados
por ora então me baste.


Fernando Campanella