Foto por Fernando Campanella |
...o coração entre o lume brando
e a usura, esfumando
sem desprender a ternura.
(Fernando Campanella)
Dona Adélia estava sempre à janela quando eu passava em minhas caminhadas por aquela rua.
Todas as manhãs assistia missas pela televisão em sua sala, deixando um copo com água para "bentar", como dizia. Uma vez tomei dessa água.
Numa de nossas conversas, disse-me que o marido vestira o 'paletó de madeira' já há muito tempo e que vivia praticamente sozinha, tendo apenas visitas diárias de alguns parentes, e de um garoto vizinho que se afeiçoara a ela como a uma legítima avó.
No quintal de sua casinha havia árvores com orquídeas e bromélias, e canteiros com hortelã, rosas, manjericão...
Isso foi tudo que consegui saber nas poucas vezes em que nos encontramos. O que mais importa, para minha alegria, é que tenha me deixado tirar algumas fotos suas, em sua rica presença naquela humilde janela. E que também tenha me inspirado um poema, cujo trecho abre esta postagem.
Há alguns dias vim a saber que falecera. Vestiu seu 'casaquinho de madeira' definitivo para reencontrar o marido. Por sorte eu havia levado a ela uma das fotos de presente alguns meses antes, ocasião em que, ansioso por agradá-la, perguntei se tinha gostado do retrato. E foi com um sorriso meio a contragosto que me respondeu: gente velha não sai bem em fotografia, meu filho.
Ainda não passei por lá após sua partida. Reluto em ver sua janela fechada, vazia.
Fernando Campanella
Que lindo Fernando... você me sensibilizou e muito...!!! Obrigada, viu!?
ResponderExcluir*Mari* Mond Blau
E a música também é mil, gostamos demais aqui em casa, as vezes ela nos acompanha nas viagens...!!!
ResponderExcluirObrigada!!!
*Mari* Mond Blau
Obrigado, Mari, até que enfim apareceu um comentário em meu blog, o qual anda tão esquecidinho, rs. Fico muito feliz com tua presença hoje, e desde que criei minas páginas por aqui. Forte abraço, minha amiga.
ResponderExcluirTão linda ela...Tão parecida com as Adélias que vi na infância, com as janelas de minhas lembranças. Linda homenagem.
ResponderExcluirBeijos,
Sempre me surpreendo com o sorriso das Adélias - apesar da solidão...
ResponderExcluirÉ, Tânia, ela é parecida com as Adélias de minha infãncia também. E meu irmão quando viu essa foto disse que ela parece muito com minha avô Maria, por parte de meu pai, há muito tempo falecida. Que coisa, não, será que tal fato, o de parecer com minha avó, foi o que em meu subconsciente me levou a querer tirar uma foto dela? Sei lá, pode ter sido isso, e outras coisas mais, melhor não questionar, deixar acontecer. E que as imagens falei por si, não? Abração, obrigado pela presença, pelo carinho.
ResponderExcluirSabe, Dalva, acho que foi essa solidão tão heroica de Dona Adélia, essa ternura, apesar dessa mesma solidão, um dos motivos que motivaram a foto. E que belo sorriso, não? Apesar de ela não ter gostado muito de se ver na foto (oh, universal vaidade, rs) sua essência tão linda está ali. Um abraço, obrigado também pela presença, pelo carinho.
ResponderExcluirPerfeito demais! Emociona ao máximo!
ResponderExcluirObrigado, Antonio Carlos, pela presença e comentário. A simplicidade e a intergridade de Dona Adélia são exemplos de vida que mereciam mesmo a foto, o poema e a crônica. Abração, meu amigo.
ResponderExcluirBelíssimo texto Fernando! Sensível e lindo como você. Lembro a primeira vez que escreveste sobre ela, publiquei, naquela época, em meu blog, e também me comoveu muito, imagina agora, que ela é mais uma estrela a enfeitar o céu...
ResponderExcluirParabéns Fernando, teus escritos sempre emocionam, comovem e fazem refletir...
Sim, Mada, mais uma estrela a enfeitar o céu, um céu de rosas e manjericão. E acredito que ela gostasse de ouvir o padre Zezinho quando assistia suas missas matinais pela TV. A solidão que eu imaginava ser a de Dona Adélia talvez fosse a minha, a nossa, a de todos. A dela era povoada por Deus. Bjos, obrigado pela linda amizade que me tens, pelo carinho.
ResponderExcluirBelo presente, em poder ler e ver a junção de suas artes tomada de afetividade, sensibilidade e empatia.
ResponderExcluirImagino a alegria que Dona Adélia sentiu internamente ao rebecer sua imagem/ retrato das marcas de uma História.
Fernando Campanella,continue nos presenteando com suas fotografias, poemas e contos.
ResponderExcluirSeu iluminado!