segunda-feira, 17 de junho de 2013

CREPÚSCULOS

Foto por Fernando Campanella

As tardes de outono propiciam crepúsculos inigualáveis. Embora os atores - nosso velho, vaidoso sol, as frívolas nuvens, o ar, o imponderável vento... – sejam sempre os mesmos em outros períodos do ano, é nesses dias que precedem o inverno que os espetáculos do fim da tarde rendem maior vibração em luz, forma, tom e cor.

Os crepúsculos outonais lembram algo como o capricho de um demiurgo 
a brincar com infinitas possibilidades na reorganização de toda matéria preexistente. Uma arte de tamanha grandeza, de tão poderoso efeito, onde o criador, o sujeito, se esquece e passa a ser objeto da própria criação.

Assim, em escala menor, com todos artistas que, movidos por um impulso interno, reestruturam o que vivem, o que recebem, neste insondável processo atópico, acrônico, que denominamos "criar".

Assim, com a poeta Emily Dickinson que, tocada pelos crepúsculos de Amherst, reestruturou as impressões, as emoções internas, rendendo este maravilhoso universo-poema:

219

Ela varre com vassouras multicores
E sai espalhando fiapos,
Ó Dona arrumadeira do crepúsculo,
Volta atrás e espana os lagos:

Deixaste cair novelo de púrpura,
E acolá um fio de âmbar,
Agora, vejam, alastras todo o leste
Com estes trapos de esmeralda!

Inda a brandir vassouras coloridas,
Inda a esvoaçar aventais,
Até que as piaçabas viram estrelas —
E eu me vou, não olho mais.

Tradução: Aíla de Oliveira Gomes

Texto inicial por Fernando Campanella


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