sexta-feira, 19 de julho de 2013
SAL VERDE
Nas enciclopédias multimídias do terceiro milênio
os dinossauros verdes do mundo
serão o cult da garotada - teóricos vão digitar
sobre a extinção das árvores em massa.
Fernando Campanella
domingo, 14 de julho de 2013
ARTE-FINAL
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Foto por Fernando Campanella |
"Mais do que ningém
posso de minha sorte reclamar
e, ao mesmo tempo,
com ela me alegrar..."
(Guillaume de Machaut, compositor
e poeta francês do século XIV)
Desenho a melancolia
numa folha de papel.
Que minha dama,
de longa data e tediosa face,
pudesse, transposta de mim,
tão graciosa sagrar-se,
eu não sabia.
Fernando Campanella
quarta-feira, 10 de julho de 2013
OFERENDA
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Foto por Fernando Campanella |
Elevo a ti
o cálice profano de minha agonia
minhas carrancas são esconjuros
o cálice profano de minha agonia
minhas carrancas são esconjuros
de tua longa
memória que me vê.
Minas de meus
tormentos -
mãe e madrasta de meus versos -
duras noites me impuseste.
Acolhe tua criança,
dá-me de teus braços
a endorfina que amanhece.
mãe e madrasta de meus versos -
duras noites me impuseste.
Acolhe tua criança,
dá-me de teus braços
a endorfina que amanhece.
Fernando Campanella
domingo, 23 de junho de 2013
UMA ÁRVORE
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Foto por Fernando Campanella |
Antes dos fundamentos de Minas,
eu já era, com as bicas e as fontes.
Mãe dileta das relvas, das grotas,
cobria em tapete ileso
a vasta inconsciência da terra
em suas planuras e montes.
Seguia, alegre, as curvas, as margens
de corredeiras e rios, acatava
em silêncio o clamor dos trovões -
minha seiva corria equânime
sob o esplendor dos elementos
ou as gasturas invernais.
Preparei longa e arduamente a casa,
alimento e berço, a morada,
para as futuras criações em asas.
Seguia, alegre, as curvas, as margens
de corredeiras e rios, acatava
em silêncio o clamor dos trovões -
minha seiva corria equânime
sob o esplendor dos elementos
ou as gasturas invernais.
Preparei longa e arduamente a casa,
alimento e berço, a morada,
para as futuras criações em asas.
Acima de mim, para além do sol,
era apenas o pêndulo da noite
ritmando a dança dos astros –
o espelho – a incógnita dos primórdios.
Fernando Campanella
segunda-feira, 17 de junho de 2013
CREPÚSCULOS
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Foto por Fernando Campanella |
As tardes de outono propiciam crepúsculos inigualáveis. Embora os atores - nosso velho, vaidoso sol, as frívolas nuvens, o ar, o imponderável vento... – sejam sempre os mesmos em outros períodos do ano, é nesses dias que precedem o inverno que os espetáculos do fim da tarde rendem maior vibração em luz, forma, tom e cor.
Os crepúsculos outonais lembram algo como o capricho de um demiurgo a brincar com infinitas possibilidades na reorganização de toda matéria preexistente. Uma arte de tamanha grandeza, de tão poderoso efeito, onde o criador, o sujeito, se esquece e passa a ser objeto da própria criação.
Assim, em escala menor, com todos artistas que, movidos por um impulso interno, reestruturam o que vivem, o que recebem, neste insondável processo atópico, acrônico, que denominamos "criar".
Assim, com a poeta Emily Dickinson que, tocada pelos crepúsculos de Amherst, reestruturou as impressões, as emoções internas, rendendo este maravilhoso universo-poema:
219
Ela varre com vassouras multicores
E sai espalhando fiapos,
Ó Dona arrumadeira do crepúsculo,
Volta atrás e espana os lagos:
Deixaste cair novelo de púrpura,
E acolá um fio de âmbar,
Agora, vejam, alastras todo o leste
Com estes trapos de esmeralda!
Inda a brandir vassouras coloridas,
Inda a esvoaçar aventais,
Até que as piaçabas viram estrelas —
E eu me vou, não olho mais.
Tradução: Aíla de Oliveira Gomes
Os crepúsculos outonais lembram algo como o capricho de um demiurgo a brincar com infinitas possibilidades na reorganização de toda matéria preexistente. Uma arte de tamanha grandeza, de tão poderoso efeito, onde o criador, o sujeito, se esquece e passa a ser objeto da própria criação.
Assim, em escala menor, com todos artistas que, movidos por um impulso interno, reestruturam o que vivem, o que recebem, neste insondável processo atópico, acrônico, que denominamos "criar".
Assim, com a poeta Emily Dickinson que, tocada pelos crepúsculos de Amherst, reestruturou as impressões, as emoções internas, rendendo este maravilhoso universo-poema:
219
Ela varre com vassouras multicores
E sai espalhando fiapos,
Ó Dona arrumadeira do crepúsculo,
Volta atrás e espana os lagos:
Deixaste cair novelo de púrpura,
E acolá um fio de âmbar,
Agora, vejam, alastras todo o leste
Com estes trapos de esmeralda!
Inda a brandir vassouras coloridas,
Inda a esvoaçar aventais,
Até que as piaçabas viram estrelas —
E eu me vou, não olho mais.
Tradução: Aíla de Oliveira Gomes
quinta-feira, 13 de junho de 2013
TREZE DE JUNHO
Hoje de manhã, na fila da padaria, algumas mulheres comentavam sobre simpatias feitas a Santo Antônio para arranjarem marido ou namorado.
- Já enterrei a imagem do santo de cabeça pra baixo, num poço, e nada ainda – dizia uma.
- Eu até roubei a imagem do menino Jesus que estava nos braços dele, só vou devolver quando aparecer um marido – dizia outra.
Uma terceira senhora entrou na conversa, rindo aos montes, dizendo que não queria saber da casamento mais não, melhor ficar sozinha. O primeiro marido fazia todas suas vontades, só faltava estender o tapete por onde ela passava, mas falecera poucos anos após se casarem. O segundo, e último, estendia o tapete, sim, mas para pisar nela, espicaçá-la, atormentá-la. Não aguentou o tranco e o despachou o mais rápido possível.
Um homem de meia-idade juntou-se à conversa, dizendo que a pessoa certa para a gente pode estar ao nosso lado e não percebemos, não precisamos procurar tanto. Mas acrescentou, jocosamente: eu queria mesmo era casar com a Gisele Bündchen.
Foi uma gargalhada geral, até o atendente da padaria fez um comentário, dizendo que não dispensava tal modelo como namorada.
Era tudo descontração, para esquecer o tempo na longa fila, eu sabia, mas não deixei de pensar que temos que ter cuidado com nossos sonhos e desejos, desenvolver a arte de saber o que realmente nos importa e nos faz felizes.
De qualquer forma, o velho, bom Antônio, do meu aniversário, da minha infância, do Itaim, das festas do bairro das Cruzes, ainda está em pauta nos corações, nas conversas, fazendo jus à reputação de santo casamenteiro.
Após apanhar meu pão, saio de lá com a certeza de que tenho mais fé na fé, em si, poderosa, formada pela corrente de almas que há séculos vêm mentalizando preces para o alívio da dor, em busca da felicidade tantas vezes abortada nas durezas da vida.
Por outro lado, confesso que trago a medalhinha do meu santo numa corrente no pescoço. Em momentos difíceis, esqueço as racionalizações, peço a ele que me ampare, e consigo, ou, mais importante, acredito que consigo, o que peço.
Mas hoje, no meu aniversário, quero apenas agradecer pelas tantas coisas boas que a vida tem me outorgado - amor, amizade, arte, alegrias... E se eu pedir algo, será, certamente, para que seja dada saúde à minha família, eu incluído, e aos meus amigos. E que minhas bênçãos sejam preservadas.
Fernando Campanella
(Foto tirada hoje, na estrada que liga Borda da Mata a Ouro Fino, sul de MG)
domingo, 2 de junho de 2013
IMEMORIAL DE MINAS
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