Foto by Fernando Campanella
(Casa sesquicentenária de Gonçalves, sul de MG)
Íamos em um passeio pela área rural de Gonçalves, MG, bela cidadezinha encravada nos contrafortes da Mantiqueira. O casal de amigos estaciona o carro a uma certa altura para nos mostrar uma casa sesquicentenária, tida como a mais antiga do município. Um singelo monumento, preservado, seus porões em pedra, caiação nas paredes de pau-a-pique, antigas telhas escurecidas pelo tempo, um verde-negro em janelas e portas.
Excelente motivo para uma foto aquela casa na tarde. Quando nos aproximamos daquela maravilha, com seu mistério, seus segredos embrulhados em névoas e sonho, algo como um reconhecimento bateu em mim. Pareceu-me tê-la visto antes, e logo me lembrei que por ali já passara havia uns quinze anos. Na época, 1993, estava eu em férias em casa de amigos que lá então residiam. E em um dia frio transitáramos por aquele sítio.
A ocasião de minha visita anterior fora triste pois alguém havia falecido naquele lar.. Escutávamos as orações vindas de seu interior, algumas pessoas circunspectas à porta, uma atmosfera longa de pesar e dor, naquele grave silêncio do momento que viviam. Deparamo-nos com um homem de uns vinte e oito anos, inconsolável , em lágrimas, e o cumprimentamos.
Mas não nos detivemos por ali.. Algo como um pressentimento, um certo medo da perda de meus próprios entes queridos havia me tomado naquele momento. E logo partimos, meus amigos e eu, como se fugitivos, crianças buscando seus brinquedos e acontecimentos mais descompromissados da finitude de tudo.
Quinze anos mais tarde , algumas duras perdas já sofridas , eu haveria de retornar àquela casa do luto. À sua porta, reconheci o rapaz entristecido daquela época, agora um senhor, adentrando a meia-idade. Apresentei -me, pedi licença para tirar algumas fotos. E contei -lhe, então, de minha lembrança. Surpreso, o homem confirmou o falecimento da mãe naquela ocasião. Dona Mariana havia contraído uma infecção pulmonar, sendo levada ás pressas para São José dos Campos onde alguns dias depois viera a falecer. O sepultamento fora no cemitério local, de São Sebastião das Três Orelhas, o santo assim cognominado pelos três imponentes e altos picos da região.
O filho relatava-me o passamento da mãe, e algo como um vazio, uma certa tristeza, ainda nublava seu olhar. Porém, senti, mais que uma surpresa, uma certa gratidão vindo de sua alma, por eu, talvez, um turista como tantos que por ali passavam , de repente ter me lembrando de algo tão irrelevante aos olhos do mundo, tão precioso à sua memória.
Ao me despedir, senti-me aliviado, como por um dever, por feliz coincidência, então cumprido. E incorporei minhas perdas, minhas lágrimas, agora mais amadurecido em minha trajetória do mundo.
À porta daquela casa antiga havia um crucifixo. Dona Mariana, permanecia ali, eterna, naquele ícone, na casa singela, na memória do filho. Também presente na saudade de todos os caríssimos meus que as alegrias e dores na terra já haviam cumprido..
Requiescat!
Fernando Campanella, 10 de outubro de 2008
Excelente motivo para uma foto aquela casa na tarde. Quando nos aproximamos daquela maravilha, com seu mistério, seus segredos embrulhados em névoas e sonho, algo como um reconhecimento bateu em mim. Pareceu-me tê-la visto antes, e logo me lembrei que por ali já passara havia uns quinze anos. Na época, 1993, estava eu em férias em casa de amigos que lá então residiam. E em um dia frio transitáramos por aquele sítio.
A ocasião de minha visita anterior fora triste pois alguém havia falecido naquele lar.. Escutávamos as orações vindas de seu interior, algumas pessoas circunspectas à porta, uma atmosfera longa de pesar e dor, naquele grave silêncio do momento que viviam. Deparamo-nos com um homem de uns vinte e oito anos, inconsolável , em lágrimas, e o cumprimentamos.
Mas não nos detivemos por ali.. Algo como um pressentimento, um certo medo da perda de meus próprios entes queridos havia me tomado naquele momento. E logo partimos, meus amigos e eu, como se fugitivos, crianças buscando seus brinquedos e acontecimentos mais descompromissados da finitude de tudo.
Quinze anos mais tarde , algumas duras perdas já sofridas , eu haveria de retornar àquela casa do luto. À sua porta, reconheci o rapaz entristecido daquela época, agora um senhor, adentrando a meia-idade. Apresentei -me, pedi licença para tirar algumas fotos. E contei -lhe, então, de minha lembrança. Surpreso, o homem confirmou o falecimento da mãe naquela ocasião. Dona Mariana havia contraído uma infecção pulmonar, sendo levada ás pressas para São José dos Campos onde alguns dias depois viera a falecer. O sepultamento fora no cemitério local, de São Sebastião das Três Orelhas, o santo assim cognominado pelos três imponentes e altos picos da região.
O filho relatava-me o passamento da mãe, e algo como um vazio, uma certa tristeza, ainda nublava seu olhar. Porém, senti, mais que uma surpresa, uma certa gratidão vindo de sua alma, por eu, talvez, um turista como tantos que por ali passavam , de repente ter me lembrando de algo tão irrelevante aos olhos do mundo, tão precioso à sua memória.
Ao me despedir, senti-me aliviado, como por um dever, por feliz coincidência, então cumprido. E incorporei minhas perdas, minhas lágrimas, agora mais amadurecido em minha trajetória do mundo.
À porta daquela casa antiga havia um crucifixo. Dona Mariana, permanecia ali, eterna, naquele ícone, na casa singela, na memória do filho. Também presente na saudade de todos os caríssimos meus que as alegrias e dores na terra já haviam cumprido..
Requiescat!
Fernando Campanella, 10 de outubro de 2008
Maravilhosa essa crônica, puxa tive o prazer de conhecer essa casa, na área rural de Gonçalves. Você se utiliza formidavelmente das ferramentas para tecer tão lindos escritos. Parabéns!!!
ResponderExcluirVc tem uma foto desta casa também, nao? Que maravilha ela é. Grande abraço.
ResponderExcluirTexto maravilhoso!!!.
ResponderExcluirQuantas perdas já passei...
Quantas lágrimas...
É a constatação da finitude da vida.
E nossa forma de olhar o mundo passa
por uma ótica diferente... com mais
compaixão e empatia.
Obrigado, Amália, vc é sempre muito bem-vinda aqui neste cantinho. Esta crônica, com a foto, é muito especial para mim. Grande abraço.
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