sexta-feira, 10 de abril de 2009

ALMA DE MINAS


São Domingos, foto by Fernando Campanella


“Sou um recém-cogumelo
No pasto-Minas brotado,
Chuvas que caem pra onde se alongam,
Olhos que vêem, o que enxergarão?”

São Domingos, mais uma parcela infinitesimal de Minas que almejo. Indago a uma senhora pelo caminho certo, e sorridente ela me aponta a estradinha de terra e pergunta “Vai rezar lá em cima meu filho?"

São Domingos é uma serra, um paredão de matas verdes, cachoeiras, um bairro e sua gente. E uma igreja construída por devotos. Há alguns anos um rapaz teve visões de Nossa Senhora naqueles altos. Teria recebido revelações apocalípticas e conselhos sobre a urgência da fé e da oração para um rearranjo espiritual do mundo.

Aquele lugar é tudo da Terra e mais uma aquarela dos deuses. Hospeda e transcende toda inquietação humana. Região mais fria, de ar mais rarefeito, a temperatura cai seis ou sete graus quando lá subimos. Campos de cultivo de milho, de batata, pastos, vacas de leite, bares perdidos à beira da estrada ... Tão acostumado deve estar a gente dali à natureza que não sei se consegue enxergar a beleza de suas araucárias, suas luas e seus pássaros encantados.

Ali vacas mastigam ad aeternum os pastos e, em minha curta visita, eu as mirava contra a paisagem de um sol caindo à boca de um monte, em algum buraco da noite, suave momento em que a terra recolhia a luz.

Passei pela sua igreja lá em cima mas a modernidade forçada de sua arquitetura não me estimulou a entrar. Meu coração se abriga em capelas mais simples, despojadas, onde corujas pousam à noite, em cujo interior imagens de santos são depositadas.

No caminho de volta, pintado entre montanhas, em singelas pinceladas, surgiu um povoado de onde partiam sons – matracas, algum canto sacro, uma litania - naquele entardecer de uma sexta -feira santa. Fiéis portando velas, preparavam-se para uma recomendação das almas.

Passamos por eles , porém ninguém nos olhou. Graves, temerosos de maus espíritos, não se atreveriam, talvez, a distrair os olhos do intuito que ali os reunia. Já deles a uma certa distância, ousei olhar para trás. E vi a alma de Minas, toda misteriosamente clara, tão antiga, entre aquela gente, orbitando aqueles montes.
Fernando Campanella, 5 de abril de 2007


4 comentários:

  1. Fenando, o seu blog foi-me recomendado pelo meu amigo d'Angelo. Andei a "passear-me" por ele e pude ver que é um espaço muito interessante porque o seu conteúdo tem poesia, informação, imaginação e uma excelente escrita. Virei visitá-lo mais vezes.
    Um abraço.

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  2. Olha, concordo com a Graça e a excelente indicação do D´angelo! Parabéns por esse lindo escrito. São Domingos é mais um dos mágicos lugares que estão por nossa região! Mágico! Abraço...

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  3. Muito obrigado pela primeira visita, Graça. Procuro fazer de meu blogger não só um espaço para meus escritos e fotos, mas também para uma ponte que me conecta em sensibilidade ao mundo. Assim vão aparecer trabalhos de poetas que são importantes para mim, fotos e escritos de amigos que de alguma forma têm ligação com minha alma. E gosto muito da interatividade na seção dos comentários.
    O D'Ângelo já havia me falado de teu trabalho. Vou visitar teu blogger também, já li alguns trabalhos teus e gostei muito do que vi. Vc escreve poemas que estão na linha do que aprecio, da boa poesia. Muito obrigado.

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  4. Muito obrigado, meu grande amigo Antônio. Pode acreditar que tua presença em minhas páginas me dá muito incentivo para continuar a criar com mais força e vontade. Vc é um grande amigo e sei que separa a amizade para melhor avaliar meu trabalho, para fazer um comentário isento. Venha sempre aqui, sinto falta quando vc não envia um comentário. Muito obrigado.

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