quinta-feira, 15 de abril de 2010

A CÉU ABERTO II


Foto by Fernando Campanella

...meu olfato de Minas
são aromas verdes
são bezerros alados.
(Repastos, Fernando Campanella)

sábado, 10 de abril de 2010

ÓRBITAS


Foto by Fernando Campanella


Madrugada,
três vezes canta ainda o galo
em sua órbita assinalado.
Espio o colar de estrelas errantes
contornando o torso da noite -
três vezes, em silêncio,
ainda àquela porta eu bato
e não me atende o coração
do recolhimento indevassável.

Quantas almas e o assombro de um Deus
não terão assim por um instante
se entreolhado!

Fernando Campanella

Nota:

Hoje li uma entrevista concedida pela escritora brasileira Nelida Piñon à revista Isto É, publicação de 24 de fevereiro de 2010. Quando lhe perguntaram qual deveria ser a posição do escritor diante das regras do mercado, esta resposta, muito interessante, foi dada:

"É preciso ter aquela inocência associada à paixão literária. Não importa o que você faça, o que vai valer é a sua decisão. Mesmo que depois você não desperte o interesse do editor. Mas assim exerce a soberania até às últimas consequências. Isso proporciona uma liberdade extraordinária para o artista. Nenhum prêmio substitui esse espírito de liberdade, de não temer o mercado, não temer o leitor descuidado e não temer as livrarias que não querem mais expor o seu livro..."

(Nélida Piñon em entrevista à Isto É, publicação de 24.02.2010)

Lúcidas palavras dessa escritora que foi homenageada recentemente com o prêmio Casa de Las Americas - instituição cubana que apoia e premia escritores latinos - pela obra "Aprendiz de Homero". (Fonte: Revista Isto É)

Música desta postagem: Suite para Violoncelo número 1, Prelúdio, de Bach.

terça-feira, 6 de abril de 2010

CAMPO DE TREVOS


Foto by Fernando Campanella

O coração em vinho tinto
as pedras lisas
e ao dobrar de cada esquina
um dragão.
Vamos, me dê a mão,
no amor em seus labirintos
nos percamos com cuidado -
ah, este risonho campo de trevos
minado.

Fernando Campanella


Ouça no yoututube, abaixo, a Gymnopédie No.1 de Erik Satie, escolhida para esta postagem:

sábado, 3 de abril de 2010

EFEMÉRIDES (ABRIL)


Tela by Craigie Aitchison*
Guardian, El dado del arte
3.bp.blogspot.com/.../Cypress+Tree+and+Dog.jpg

abril são céus azuis
em ciprestes longos
agulhados

e uma brisa
um quase olfato
de outros jardins
submersos
não decodificados -

aves breves
bicam leve
a eternidade

Fernando Campanella

* Comentário extraído do blog ambitosproprios.blogspot.com, a respeito da obra de Craigie Aitchison, cuja tela (acima) ilustra esta postagem:
Na pintura a expressão poética tem sua própia rima e sua própia maneira de seduzir. E em algumas ocasiões, quando é um fiel reflexo da natureza do pintor, chega a tocar o centro de gravidade da sensibilidade coletiva. Este homem (Aitchison) e suas cores são um bom exemplo.
(Javier)

Ouça, abaixo, o Choro número 1 de Heitor Villa-Lobos, escolhido para esta postagem.


segunda-feira, 29 de março de 2010

À NOITE SONHAMOS


Lua nova
Foto by Fernando Campanella

...À noite sonhamos em um céu de metáforas
onde a mínima lua é unha que arrepia segredos
estrelas são hangares pequeninos
e a sombra, um lobo dócil que nos chama.

À noite rompemos degredos
volvemos aos ninhos
somos meninos -
infância distraída de seus medos.

Fernando Campanella


Notas:
1) Devo estar em uma fase lunar, realmente. Mas, revisitando meus poemas, percebo que há no que escrevo quase sempre uma lua, vaga ou explícita, a tocar minhas palavras.

2) Agradeço à minha amiga Maria Madalena que desde o início de nossa amizade acreditou no poema acima, e o adotou, tornando seus esses meus versos.

3) Ouça,abaixo, a Berceuse Op 57 de Chopin, tocado por Arthur Rubinstein.


domingo, 28 de março de 2010

VÓRTICE


Foto by Fernando campanella

carente
é juba sem pente
dente sem osso

fosso

mundo girando
em vórtice fundo

dentro sem beira
tempo sem flora
quando sem quando

alma que mente
boca que tudo piora

céu sem relento
buraco negro
estrela sem glória

amor indigente
serpente
que a cauda enrola

ora pro nobis

esfinge
que se devora

Fernando Campanella


Vídeo escolhido para esta postagem: Trecho da suíte para piano Op 25, primeira parte, de Arnold Schoenberg, executada por Glenn Could.



Nota: O compositor austríaco, Arnold Schoenberg, 'compôs obras que hoje classificamos como "atonalismo livre". Este conceito tenta dar sentido a uma prática que abandonou as hierarquias tonais. Não mais uma família de 7 notas centradas na polarização entre tônica e dominante. Agora o total cromático de 12 notas passava a ser usado como se todas tivessem a mesma importância...'

(Informação transcrita do blog 'Página de Cultura, por André Egg, link abaixo.)

quarta-feira, 24 de março de 2010

CONTOS DA LUA

Lua crescente
Foto by Fernando Campanella

lua, lua, lua,
três vezes giro
para retornar à fria
estática de teu silêncio
(Fernando Campanella)

I

após a chuva
a lua em bruma
expele um halo

e na lagoa rasa
passo a noite
engolindo os sapos

II

a lua banha o rosto
na lagoa

- peixes miúdos
transparecem
nesse oceano ralo

III

resguardo os amantes
estanco as ondas
e as marés -

no conto da lua
esta noite
claramente eu não caio

Fernando Campanella


Vídeo escolhido para esta postagem: 'Autum moon over the calm lake' (Lua de outono sobre o lago calmo), canção tradicional chinesa.