domingo, 17 de janeiro de 2010

JOGO


Mar de Fernando Noronha
Foto by Fernando Campanella

Há os que buscam continentes,
eu fico,
é menos sólida
a terra de que me sustento.
( Ah, a densidade dos anjos,
os imprecisos firmamentos! )

Há os que apostam em veleiros
e desafiam os ventos,
eu passo.

Eu do mar abro os búzios,
meu lance
é a configuração do silêncio.

Fernando Campanella, 2006.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

CONFESSIONAL


Foto by Fernando Campanella


A quantas anda minha poética neste fim de tarde de domingo, no secreto limo deste ar molhado? Penso em famílias recolhidas, sinto o tempo instilando as horas... Eu não queria ser este ninho sem pássaro.

Desterro a memória de tudo que jaz em mim em mim, e me calo, dói-me saber que algum descuido, um sortilégio já inalcançável talvez tenham me feito assim.

São tantas as saídas, tenta-me a roda do mundo : buscar um ópio, abrir o mágico, ouvir os sapos... Tecer a exaustiva inutilidade dos versos. Mas nada hoje me conforma, meu lirismo não sacia os recônditos lábios.

Há neste final de tarde prenúncios de um túnel de longa noite onde me deserte , um niilismo em sutil camuflagem. Um ainda aguardar (vaidade suprema) de meus úmidos, teimosos versos a eternidade.

Fernando Campanella, 1986

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

SÃO LUÍS DO PIRAITINGA


Foto by Antonio Carlos Januário

A igreja Matriz de São Luís de Tolosa ( foto), segundo o site 'Cidades Históricas' http://www.cidadeshistoricas.art.br/paraitinga/par_mon_p.php foi construída no século XIX em São Luís do Piraitinga, estado de São Paulo. Com uma arquitetura mesclada de elementos dos estilos barroco e neo-clássico, tem em seu interior inúmeros afrescos e vitrais. Sua nave principal conserva muito do melhor do magistral estilo barroco.

Há alguns anos, na segunda quinzena de dezembro, estive nessa maravilhosa igreja onde assisti a uma apresentação especial de natal com orquestra e coral da cidade de São Paulo. A atmosfera do local, tão similar a Ouro Preto e congêneres, é algo que está gravado em minha mais grata lembrança.

Àquela época eu não tinha interesse por fotografia, perdi a oportunidade assim de registrar esse tesouro arquitetônico que preservava nossa história: São Luís do Piraitinga, como se sabe, teve oitenta por cento de seu centro histórico destruído pelas chuvas deste final/início de ano. E dois dos dos acontecimentos mais chocantes dessa tragédia foram os desabamentos, de sua igreja matriz , captado por um cinegrafista amador, e de sua Capela de Nossa Senhora das Mercês.

Há exatamente dois anos, no início de janeiro, meu amigo Antonio Carlos esteve na cidade e me enviou a belíssima foto, postada acima, onde se vê a igreja matriz mais ao centro. Fica aqui minha homenagem, minha solidariedade, aos habitantes desse lugar tão caro à minha memória. Sinto, então, como se eu próprio houvesse colhido essa imagem da foto, pois o amor a São Luís do Piraitinga, ao seu povo, à sua herança arquitetônica, tem tamanhos iguais em mim e em meu amigo. E em nós, Minas, com um passado comum com São Paulo e Rio de Janeiro pela longa e sinuosa Estrada Real e pelo Ciclo Cafeeiro que nos unem.

Aos Piraitinguenses ( acredito serem assim chamados os habitantes da cidade), ficam meus votos de recuperação de seus lares, e, se possível, de suas igrejas, visto que o Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico ( Condephaat) de São Paulo conserva as plantas originais das mesmas.

Fernando Campanella

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

IMPRESSIONISTA*


Foto by Fernando Campanella

...eu furto cores,
clico roxos que se miram
em espelhos que me expandem

bebo a luz, traço a alma,
eu sou o impressionista ambulante

então nem me perguntes
por quais cambiantes geografias me espalho:
meus olhos são câmeras mimadas
meus pincéis são artífices do instante.

Fernando Campanella, trecho do poema Ninfeias.

*Este poema foi escrito em março de 2007, antes de qualquer interesse meu por fotografia. A imagem das flores no vaso foi conseguida de um jardim, na manhã de 5.01.2010.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

BÁLSAMO


Foto by Fernando Campanella

O amor é triste – proclamam minhas viúvas.
Mas diz o filósofo: a alegria corteja
a mais profunda eternidade.

Todas vertentes consideradas
abandono o vale
onde as sombras compõem a enormidade.

Os grilos agora tilintam, e a luz da lua
impregna as árvores de um bálsamo –
meu amor, se possível, me aguarda,
retorno a ti, clara a trilha
que agora a meus olhos se abre.

Fernando Campanella


BALM
Love is sad –
Would my widows proclaim.
But said the philosopher:
Joy courts deepest eternity.

All things considered, I leave the valley
Where shadows rise domain.

The crickets are tinkling,
The moonlight is embalming the trees-
Wait , shall you, my love,
I can now see the trail,
I am returning to thee.
Fernando Campanella



sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

MIL-CORES


Mil-cores
Foto by Fernando Campanella

esta luz
que entra em meu quarto
resvala nas sombras

me distende os neurônios
apazigua meus mortos

toca o eterno
na cela da hora

afaga as mil cores
e faz de minha alma
uma casa feliz

Fernando Campanella, 2006

quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

DIÁLOGO


Foto by Fernando Campanella

Abaixo, uma montagem que fiz com alguns poemas meus e os comentários de meu amigo Brandão, (http://poesiacronica.blogspot.com/ ) aos mesmos.
Um diálogo com um tema tão gasto/tão novo como um ano que finda e outro que inicia.

Os segundos, as horas, os anos,
lá se vai mais um dia
do tempo que inventamos....

(Fernando Campanella)

Criamos o tempo, que nos destrói, mas a beleza nos salva. A beleza é de tal forma essencial que a forma mais sublime de Santo Agostinho referir-se a Deus foi na apóstrofe: "Ó Beleza antiga e sempre nova!"

(José Carlos Mendes Brandão)

por que moer
a mesma pedra?

por que a mesma esfera
sobre ossos
ad nauseam a girar?

nada mesmo de novo
sob o sol parece haver -
salvo um olhar

(Fernando Campanella)

Nada de novo - nem o sol, nem a pedra. Conservemos o olhar virgem, olhemos para as coisas como se as víssemos pela primeira vez, o que é bem Alberto Caeiro, mas sempre vale. Tudo já foi dito, não há nehuma ideia nova. Somente o olhar é novo. Eu disse em mais de um poema algo como: "Vazei os meus olhos / para ver."

(José Carlos Mendes Brandão)